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Autarquia endividada contrata ex-ministro do STJ por R$ 2 milhões

Casal dispensa licitação para Nefi Cordeiro tentar liberar R$ 400 milhões no STF

Enquanto lida com uma dívida de cerca de meio bilhão de reais em seu passivo, a Companhia de Saneamento de Alagoas (Casal) dispensou licitação para contratar, por R$ 2 milhões, o escritório de advocacia do ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Nefi Cordeiro.

O objetivo do contrato assinado no último dia 4 de outubro com a Nefi Cordeiro Advocacia é a atuação no Supremo Tribunal Federal (STF) pela garantia de que a autarquia estadual receba R$ 400 milhões da outorga do saneamento na Região Metropolitana de Maceió, obtida pela BRK Ambiental.

O processo no qual o ministro aposentado trabalha é a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 863, em que o Partido Socialista Brasileiro (PSB) questiona a liberação para o Estado de Alagoas de um montante de R$ 2 bilhões da outorga do saneamento. No processo aberto pelo partido do prefeito de Maceió, João Henrique Caldas, o “JHC”, o ministro-relator Edson Fachin impediu, na última quarta-feira (3), que o governo de Renan Filho (MDB) movimente R$ 1 bilhão deste montante, até o julgamento final da causa.

Antes de o contrato ter sido assinado, em 4 de outubro, o escritório de Nefi Cordeiro já havia atuado no processo em favor da Casal. Ele obteve a vitória inicial da batalha judicial em 29 de setembro, com a decisão de Fachin, que permitiu o ingresso da autarquia estadual como parte (amicus curiae) na referida ADPF 863.

Ministro aposentado do Superior Tribunal de Justiça, Nefi Cordeiro. Foto: STJ

Dívidas e justificativas

Por meio de requerimento com base na Lei de Acesso à Informação (LAI), o Diário do Poder teve acesso ao contrato da Casal com a Nefi Cordeiro Advocacia. A contratação foi direta, com inexigibilidade de licitação, sob a alegação de que se trata de “serviço técnico especializado, de natureza singular e com notória especialização do contratado”.

Para o questionamento sobre o fato de que a Casal já teria um setor jurídico e procuradores públicos à disposição, e sobre por qual motivo não foi evitado o gasto público com a contratação de R$ 2 milhões, a autarquia presidida por Clécio Falcão respondeu o seguinte:

“A Casal dispõe de uma Superintendência Jurídica, composta por 02 (duas) gerências, GEJUR e GECOT, totalizando apenas 03 (três) advogados na Companhia para uma demanda de processos administrativos (internos), motivo pelo qual demandas que envolvem processos judiciais (e neste caso, junto ao STF), de causas mais complexas e estratégicas para a Casal, costumam ser acompanhados por escritórios contratados”, disse a autarquia, ao afirmar que a contratação ocorreu de forma direta, conforme previsto em Lei e de acordo com todos os requisitos legais.

Em julho, em entrevista à Gazetaweb, o presidente da Casal descreveu a evolução da situação financeira da autarquia a partir de 2015, quando assumiu o cargo com mais de R$ 900 milhões em dívidas. “Nesses últimos seis anos, devido ao esforço de gestão, à contribuição dos funcionários e às medidas que tomamos, a companhia demonstrou ser uma empresa viável, deu cinco superávits seguidos (2016 a 2020) e assim conseguimos reduzir esse passivo para cerca de R$ 565 milhões atualmente”, relatou Falcão.

Pagamentos não realizados

Conforme planilha orçamentária prevista no contrato assinado, o escritório de Nefi Cordeiro deveria ter recebido R$ 250 mil para elaborar a petição de ingresso da Casal na ADPF, na data da assinatura da proposta. E outros R$ 250 mil pelo êxito da aceitação do ingresso da Casal no processo. Mas a Casal informou à reportagem que, até a última sexta-feira (5), nenhum pagamento havia sido feito à Nefi Cordeiro Advocacia. “Até o momento, nenhum valor foi repassado para o escritório”, disse a Casal.

Os outros desembolsos previstos no contrato com a Nefi Cordeiro Advocacia são R$ 500 mil para elaborar petição das razões meritórias, a serem pagos na data da assinatura da proposta; e R$ 1 milhão em honorários de êxito, com a negativa da liminar requerida pelos autores da ADPF, pagas cinco dias após a publicação da decisão.

Também atua neste contrato milionário em defesa dos interesses da Casal o escritório do advogado Marcus Vinícius Furtado Coelho, que foi presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). “O contrato foi com o Escritório de Advocacia Nefi Cordeiro. A Nefi Cordeiro Advocacia trabalha associada com a Furtado Coelho Advocacia”, explicou a Casal.

Diário do Poder enviou questionamentos sobre o contrato com a Casal ao escritório Nefi Cordeiro Advocacia. Mas não obteve respostas até a publicação desta reportagem. O contrato com a autarquia pública possui cláusula de confidencialidade.