A partir de hoje até o dia 1º de abril abrem-se as portas da esperança para os deputados federais e estaduais que pretendem migrar de partido, na realidade está mais para uma janela. A janela partidária, ou “janela da infidelidade”, para usar do bom e velho sarcasmo, é o período de 30 dias para que os mandatários eleitos pelas proporcionais troquem de legenda para concorrer às eleições deste ano sem sofrerem as consequências da infidelidade partidária. A janela está prevista na Lei Geral das Eleições (Artigo 93, da Lei 9.504/1997), que integra o calendário eleitoral e o prazo para trocar de legenda surgiu com a Lei nº 13.165/2015, no contexto da Reforma Eleitoral.
Dados os princípios básicos que caracterizam a janela da infidelidade é necessário analisar o fenômeno por um viés mais crítico. Sabendo que a exceção só é válida para os parlamentares em ultimo ano de mandato e que foram eleitos pela proporcionalidade, apenas os deputados estaduais, federais e distritais podem fazer esse movimento migratório, por assim dizer, e que no atual momento político, onde o presidente Jair Bolsonaro já firmou sua filiação ao PL, uma boa leva de deputados se juntará à sua bancada para fortalecer a base e garantir um bom montante do fundo partidário para os partidos aliados do presidente, que soma esse ano 6 bilhões de reais, quase 200% maior que em 2018.
A reforma eleitoral trouxe o dissolvimento das coligações e o atual modelo das federações e passou a dificultar o troca-troca eleitoral praticado pelos parlamentares até 2007, que trocavam indiscriminadamente de legenda, atualmente as regras para a troca de partido fora da janela e sem a punição da suspensão de mandatos são em caso de criação de uma sigla; fim ou fusão do partido; desvio do programa partidário ou grave discriminação pessoal. Mesmo assim, o transfuguismo observado no período da janela partidária é crescente, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), desde a criação da janela partidária foram registradas 275 troca de legendas entre deputados com mandato vigente.
Este ano a estimativa é que os dois principais partidos do Centrão – PP e PL – cheguem ao término do prazo com pelo menos 60 deputados, além dos Republicanos, que também são base de apoio ao governo Bolsonaro, que pretendem ter um aumento na sua bancada. Entra então o seguinte questionamento: se o STF considera que os mandatos proporcionais pertencem aos partidos e não aos indivíduos eleitos, qual a lógica de abrir um prazo para que esses indivíduos troquem de legenda, onde muitas vezes sequer leva em consideração a compatibilidade ideológica do partido, mas sim o cenário que mais vai beneficiá-los pessoalmente? É um questionamento longo, cheio de outras questões intrínsecas, mas que vale a pena por em pauta.
Em um cenário político onde situacionistas mudam a casaca e se tornam oposicionistas é impossível não levantar a ideia de “estelionato eleitoral”, leva-se em consideração também a confiança imposta pelo eleitor no candidato eleito, que busca a representatividade e o mínimo de respeito à democracia representativa que teoricamente se apoia nos partidos políticos, mesmo com tantas fragmentações e inconsistências ideológicas. Então não seria mais justo para o eleitor que o político eleito pela proporcionalidade que quisesse mudar de legenda entregasse o mandato e enfrentasse novamente um pleito sob a nova direção que escolheu? Seria, mas o que é justiça na política brasileira?
No fim das contas a minirreforma política de 2015 só serviu para maquiar as intensas migrações partidárias que agora passaram a ter prazo, é coerente que se faça alianças e que com a nova lei das Federações as legendas conversem entre si com a finalidade de desenhar as chapas e montar estratégias congruentes com suas expectativas nas eleições, mas quando isso é feito aos moldes do “jeitinho brasileiro” todas as boas estratégias políticas são abafadas pela peneira da ausência ideológica que transforma as legendas em um mero estepe para melhorar o desempenho eleitoral individual de cada político, no fim das contas, eles governam em favor próprio.